quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
VELHO TEMA
Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
é uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arriada de dourados pomos,
Existe, sim; mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.
(Vicente de Carvalho, Santos-SP, 1866-1924; poeta Realista)
Foto: Misha Gordin
Do livro das Horas...
"Deixa que tudo te aconteça: beleza e pavor.
Só é preciso andar: nenhum sentimento é o mais longínquo.
Não te deixes apartar de mim.
É perto a terra
a que chamam vida."
Rainer Maria Rilke, " O Livro de Horas - Livro Primeiro", 1899
Foto: DDiArte
trabalho de jardim, se a sombra
"Se o percurso das abelhas ficasse desenhado no ar, como nos veríamos?
Se a sombra fosse branca, encontrar-te-ia ?"Cristina Tavares
Foto: DDiArte
sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
MENINO CHORANDO NA NOITE
Na noite lenta e morna, morta noite sem ruído, um menino chora.
O choro atrás da parede, a luz atrás da vidraça
perdem-se na sombra dos passos abafados, das vozes extenuadas.
E no entanto se ouve até o rumor da gota de remédio caindo na colher.
Um menino chora na noite, atrás da parede, atrás da rua,
longe um menino chora, em outra cidade talvez,
talvez em outro mundo.
E vejo a mão que levanta a colher, enquanto a outra sustenta a cabeça
e vejo o fio oleoso que escorre do queixo do menino,
escorre pela rua, escorre pela cidade (um fio apenas).
E não há ninguém mais no mundo a não ser esse menino chorando.
O choro atrás da parede, a luz atrás da vidraça
perdem-se na sombra dos passos abafados, das vozes extenuadas.
E no entanto se ouve até o rumor da gota de remédio caindo na colher.
Um menino chora na noite, atrás da parede, atrás da rua,
longe um menino chora, em outra cidade talvez,
talvez em outro mundo.
E vejo a mão que levanta a colher, enquanto a outra sustenta a cabeça
e vejo o fio oleoso que escorre do queixo do menino,
escorre pela rua, escorre pela cidade (um fio apenas).
E não há ninguém mais no mundo a não ser esse menino chorando.
Carlos Drummond de Andrade
foto: DDiArte
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
esta Habitação
"Embora as grandes Águas durmam,
Que ainda assim são o Abismo
Não se pode pôr em dúvida -
Nenhum Deus vacilante
Acendeu esta Habitação
Para a deitar fora -"
Emily Dickinson
Que ainda assim são o Abismo
Não se pode pôr em dúvida -
Nenhum Deus vacilante
Acendeu esta Habitação
Para a deitar fora -"
Emily Dickinson
Foto: DDiArte
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
dilacerado
"O mundo prodigioso que tenho na cabeça. Mas como me libertar e libertá-lo sem me dilacerar? E antes ser mil vezes dilacerado do que retê-lo em mim ou enterrá-lo. Estou aqui para isso, dou-me perfeitamente conta."
Franz Kafka, "Antologia de Páginas Íntimas"
Foto: DDiArte
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